Irmão ANDRÉ OTÁVIO ASSIS MUNIZ – MI
Centenária Loja XIV DE JULHO do Rito Moderno
Oriente de São Paulo – SP
“QVAE VOLVMVS ET CREDIMVS LIBENTER”
(Acreditamos de bom grado em tudo o
que queremos)
Muitos textos e muitas idéias sobre
Maçonaria são produzidas neste início do século XXI. No Brasil temos abundância
de literatura que versa sobre o tema.
No entanto, sempre me questionei sobre a
ausência de textos que confrontem a racionalidade e a lógica implacável da ciência
com a temática maçônica.
São facilmente encontrados textos que
relacionam Maçonaria a misticismo, astrologia, ocultismo e temas afins, mas,
surpreendentemente, textos com tendência cética ou racionalista são
praticamente inexistentes.
Não faço aqui a defesa dos céticos, da
razão científica ou de coisa parecida. Simplesmente constato um fato: a maioria
do que se produz sobre Maçonaria é reflexo de uma única tendência dentro da
Ordem.
As idéias Iluministas, das quais a
Maçonaria tanto se ufana, parecem ficar escondidas dentro de um armário
invisível, do qual só se tiram pequenas citações ou vagas lembranças (quase
sempre descontextualizadas), mas que, na prática, se tornam extremamente
incômodas por questionarem algumas das mais queridas crenças de tantos maçons.
É curioso notar como pessoas que se
dizem “livres-pensadores” podem agir na contra-mão absoluta de tudo aquilo que
tal título invoca.
Pode haver livre-pensamento quando se
teme a controvérsia?
Assim, ignorando tacitamente todas as luzes
científicas, todo o método racional de trabalho, toda a lógica rigorosa do
pensamento filosófico, vai se entrando em um tipo de sonolência perniciosa, uma
indolência cheia de resquícios obscurantistas, superstições, crenças estúpidas
e mentiras deslavadas cujo objetivo é agradar ao ego fascinado por lendas e por
um mundo irreal, povoado de príncipes imortais, fadas, bruxos, magos, sábios da
montanha e poderes inimagináveis que nos possibilitem fugir para bem longe de
nossa realidade tão pouco confortável e interessante.
Desta forma, movidos pelo desejo de
fabricar uma “realidade alternativa”, os livros maçônicos vão se povoando de
“irmandades secretas”, cruzados dotados de poderes fabulosos, segredos
terríveis, explicações mirabolantes (quando não absolutamente ridículas) sobre
os símbolos operativos, iniciações nas pirâmides, conceitos astrológicos
esdrúxulos, magia medieval e outras “pérolas” que não conseguem se sustentar
perante a mais superficial análise lógica ou científica.
A Ciência Histórica é constantemente
ignorada, adulterada ou inventada de forma discricionária e aleatória pelos
profícuos escritores maçônicos. E quando alguém ousa lançar, em face de tais
“sábios”, fatos e documentos que contestam e desmentem cabalmente o que
sustentam, é como se lhes dessem uma bofetada, como se fosse uma gravíssima
injúria a constatação de seu erro... Dá a impressão de que a verdade é a grande
inimiga a quem devemos temer e de quem devemos correr céleres, antes que ela
nos arranque do doce sono em que estamos mergulhados.
É curioso notar a fisionomia crispada de
muitos quando questionamos algum de seus postulados. Em geral, quanto menos
argumentos, mais fanática é a defesa dos dogmas em que se acredita (ou se finge
acredita, por conveniência).
Por que é tão doloroso encarar a
verdade? Por que nós fugimos tanto das evidências mais gritantes?
Reflitamos: a Maçonaria é uma
instituição nascida, como hoje a conhecemos, no século XVIII (1717, para sermos
exatos). Seus grandes objetivos são induzir o ser humano ao conhecimento,
elevar a estatura moral e a dignidade da Humanidade como um todo, estimular o
livre pensamento longe de coações, proclamar a fraternidade universal,
favorecer o livre exame de todas as questões e finalmente, proporcionar de
forma anônima o bem estar dos desvalidos e o auxílio aos necessitados, fazendo
com que a Humanidade se aproxime cada vez mais dos ideais de Amor Universal.
Para atingir tais objetivos, a Maçonaria
impõe um método que lhe é próprio, a saber, sua ritualística e sua simbologia.
Qualquer pessoa com o mínimo de noção em
Psicologia e Antropologia sabe que o Símbolo é um fator poderosíssimo de
influência moral, social e comportamental para todos nós. Ora, a vivência dos
Símbolos se dá através dos ritos, da dramatização do mito que originou um ou
outro símbolo e que, conseqüentemente, desperta em nós uma série de
sentimentos, reflexões, desejos e condutas que seriam inatingíveis sem esta
“linguagem muda” que provoca o que Claude Levy Strauss chama de “eficácia
simbólica”. Tudo muito simples, muito claro.
Se quisermos estudar estas questões em
profundidade, basta recorrer a bons livros de Antropologia (M. Eliade, C. L.
Strauss, R. Girard, etc.), Psicologia (Jung, C. A. Méier, etc.) e outras
ciências correlatas.
Se quisermos entender as origens
históricas da instituição, devemos recorrer a bons livros de História, estudar
as antigas corporações de Ofício, a simbologia Operativa, a História da
Arquitetura. Devemos nos reportar ao estudo da filosofia medieval e ao
pensamento Iluminista, contextualizando cada uma destas ciências em seu tempo,
evitando cair na armadilha de “transplantar” estes conceitos para os dias de
hoje sem antes purgá-los de todos os vícios e erros inerentes às limitações da
época em que foram criados.
Tudo isso lhe parece óbvio? Pois a
muitos isto beira à atrocidade, é uma heresia digna de expulsão de qualquer
loja do globo terrestre.
Estes “muitos” querem que a Maçonaria
seja uma religião, querem Bíblias, invocações a Deus (leia-se o Deus da
Bíblia), querem faraós maçons, Pitágoras maçom, Jesus maçom. Querem explicações
fabulosas, visões místicas, ocultismo, títulos gloriosos, templários realizando
operações alquímicas sob a égide de Baphomet, paganismo, conceitos
supersticiosos misturados com pseudofilosofia e religião mal digerida, tudo
isso cozido num caldeirão alquímico chinês, temperado com muitas medalhas de
latão, paramentos e pedaços de pizza com cerveja...
Assim, aquilo que se prestaria a elevar
o Homem ruma à Ciência, ao Conhecimento e ao Progresso, acaba por se tornar uma
desculpa esfarrapada para laurear a crendice, as tolices e a pseudociência com
o “respaldo” de uma das mais belas instituições humanas, sujando-lhe o nome e
ofuscando-lhe o brilho.
A busca sincera pelo conhecimento do que
é real, daquilo que realmente pode ajudar à Humanidade, deveria ser o farol a
guiar todos os maçons. Agradando-nos ou não, a Verdade será sempre a Verdade e
é a ela que devemos buscar, mesmo com todas as nossas limitações e mesmo que a
mentira pareça bem mais convidativa e lustrosa.
Uma das condições para que alguém seja
feito maçom é ser livre. Será que diante de tudo isso podemos realmente nos
dizer LIVRES?
Será que somos suficientemente livres
para recebermos as instruções da Maçonaria?
“Não devemos acreditar nos muitos
que dizem que só as pessoas livres devem ser educadas, deveríamos, antes,
acreditar nos filósofos que dizem que apenas as pessoas educadas são livres”.
(Epicteto, filósofo romano e ex-escravo).
A Franco-Maçonaria tem como um de seus
mais elevados ideais o combate sem trégua à superstição e ao obscurantismo
escravizante.
Nosso país, o Brasil, é infelizmente
considerado um dos mais supersticiosos do mundo. Grande parcela da população
vive carregada de crendices, amuletos, ritos mágicos e idéias estranhas,
herdadas da época colonial.
A História da Humanidade tem demonstrado
que em todos os tempos a superstição e o fanatismo são elementos extremamente
deletérios para os povos que foram vitimados por eles.
As superstições tornam as pessoas
escravas de idéias sem nenhum fundamento na realidade, idéias que, se
submetidas ao crivo da razão, não passam de nuvens de fumaça.
Muitas crenças religiosas, quando
levadas de forma descontrolada, apresentam efeitos até piores do que os da
simples superstição, pois conseguem escravizar muito mais vigorosamente com
suas idéias de castigos terríveis e recompensas colossais...
Desgraçadamente, milhões de vidas já
foram ceifadas graças a essas “nuvens de fumaça”, essas ilusões espirituais
que, sem apresentar quaisquer provas, obrigam os homens a viverem reduzidos a
meros autômatos, sem poder de raciocinar por si próprios, sem ação, congelados
pelo medo do inferno e anestesiados pela esperança do céu.
Dentro da Franco-Maçonaria o Rito
Moderno, por ser um rito RACIONAL, ocupa a vanguarda do combate contra as
crendices, superstições e fanatismo.
Seria absurdo que um Franco-Maçom fosse
supersticioso, ainda mais se tratando de um modernista.
O perfil do modernista é o de um
Livre-Pensador, que examinando todas as coisas de forma cética, buscando a
verdade acima de tudo, não se pronuncia sem ter todos os elementos necessários
para formar um juízo que seja, ao menos, provável ou verossímil. Assim, o
modernista não é uma “presa fácil” dos charlatões, médiuns, quiromantes,
curandeiros, astrólogos, etc. Aliás, o verdadeiro modernista bota a correr toda
essa gente, pois faz brilhar a Luz da Verdade, a Razão Pura que afugenta todos
os oportunistas de plantão.
A palavra “cético” é muitas vezes vista
com preconceito, como se fosse um adjetivo indesejável, quase um desacato.
Muitos crédulos a usam nesse sentido. Nada mais distante da realidade!
A Franco-Maçonaria com seus símbolos e
ritos, nos remete a um paradigma moral e nos obriga a refletir sobre a missão do
Homem, enquanto membro de uma coletividade chamada Humanidade.
Uma vez interiorizados os símbolos
maçônicos, teremos homens melhores, homens de bem, homens que conseguem
enxergar muito mais além do que o vulgo profano, porém, não teremos místicos,
mágicos, magos ou seres sobrenaturais...
No Rito Moderno isso é claríssimo, uma
vez que não utilizamos nem sequer referências a idéias metafísicas ou
religiosas, tão caras a outros ritos.
As lojas do Rito Moderno devem ser
TRIBUNAS LIVRES DA RAZÃO, e não centros de exibicionismo vaidoso e de
doutrinação pseudomística.